Liderança nos tempos do burnout

É preciso investir mais e mais rápido na capacitação das lideranças

Uma reflexão sobre como promover o equilíbrio emocional do ambiente de trabalho

“Em caso de despressurização, máscaras de oxigênio cairão automaticamente. Puxe uma máscara para liberar o fluxo, coloque-a sobre o nariz e a boca, ajuste o elástico em volta da cabeça e respire normalmente. Auxilie crianças ou pessoas com dificuldades após colocar a sua máscara.”

Essa famosa frase pode provocar diferentes reações, dependendo de como e quando é ouvida. Ao escutá-la pela primeira vez, pensei: que crueldade! Como pensar primeiro em mim, antes de ajudar uma criança ou alguém que precise de ajuda mais do que eu?

É próprio de quem julga, concluir antes de ponderar. Após entender que a despressurização pode levar rapidamente à perda de consciência, percebi que, se os adultos mais aptos não colocarem as máscaras primeiro, provavelmente não terão tempo de ajudar nem a si, nem aos demais e o que restará disso tudo será um elevado número de asfixiados.

Faço uma ponte entre o uso das máscaras de oxigênio e o debate sobre saúde emocional no ambiente de trabalho, que ganha cada vez mais espaço.

São inúmeras pesquisas, levantamentos, estatísticas… Em 2020 a depressão deve ser a maior causa dos afastamentos do trabalho, segundo a Organização Mundial da Saúde – OMS (no Brasil, em 2018, já era a segunda). E isso tudo, antes da pandemia. Outros dados mostram que cerca de 80% dos brasileiros tem algum transtorno mental; mais de 60% apresentam ansiedade severa (em levantamento realizado com quase 500 mil pessoas); 32% dos trabalhadores brasileiros sofrem com os efeitos do estresse, quase metade da população já teve crise de ansiedade e mais de 40% dos trabalhadores reportam algum esgotamento mental devido a causas profissionais – o famoso Burnout.

Sem falar nas questões financeiras. Cálculos da OMS mostram que a queda de produtividade decorrente de transtornos depressivos ou outras questões emocionais gera à economia global perdas anuais em torno de 1 trilhão de dólares.

Voltando às máscaras: imaginemos que as empresas sejam aviões e seus colaboradores, os passageiros. Nesse “céu” cada dia mais turbulento, as “aeronaves” têm sido sacudidas de todos os lados. E, nos não raros momentos de “despressurização da cabine”, tem muita gente “morrendo” asfixiada porque ninguém parece estar totalmente preparado para colocar a máscara em si e depois ajudar quem precisa.

Nesses “aviões” sacudidos de um lado para outro na turbulência da Indústria 4.0 em um ambiente VUCA, quem deveria colocar primeiro a máscara em si e depois ajudar quem precisa? Em minha opinião, seus líderes.

O que vemos, entretanto, são líderes desorientados e muitos, inclusive, se alinhando àqueles que esperam alguém para lhes colocar a “máscara”.

É preciso investir mais e mais rápido na capacitação das lideranças, para que sejam os principais agentes de transformação e confiança desses ambientes, trazendo equilíbrio emocional mesmo diante de condições de muita adversidade e intensa pressão.

Acredito no revigoramento dos modelos de liderança, mais conscientes, próximos e empáticos; definitivamente não há mais espaço para o comando & controle, para a centralização, para concentração do “poder absoluto”. É tempo de trabalhar, seriamente, na implantação do empowerment e accountability, sem jogo de palavras, sem artifícios de marketing. Empoderamento e prestação de contas de verdade, mas com consciência, proximidade e empatia.

O momento é de cuidar do fortalecimento da estrutura mental, gerando condições para administrar as situações de pressão e tensão com mais inteligência emocional, com calma (que não é sinônimo de lentidão), ponderação e resiliência.

Líderes precisam ser seguros, conscientes de como desempenhar seu papel e da crucialidade de suas ações transformadoras; confiantes em sua equipe, agindo com coragem quando necessário e estimulando a ação com empatia e mantendo a proximidade com seus liderados. Assim, se tornam aqueles que, em caso de despressurização da cabine, colocarão a máscara em si e depois ajudarão os demais, mantendo a respiração de todos a mais normal possível, dentro das condições de temperatura e pressão promovidas pelas turbulências da hora. Só quem se cuida é capaz de verdadeiramente cuidar do outro.

Bem-vindos ao debate.

Carlos Henrique Cezar
Sociólogo, Administrador e Especialista em Desenvolvimento Humano
Sócio Executivo e Consultor da operação brasileira da Dynargie

 

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